É uma maravilha ir a qualquer pastelaria e poder saborear um brigadeiro, além de não ter dificuldade alguma para achar um bar que sirva caipirinha. A felicidade é tanta que nós quase nos esquecemos de que, na receita original do drinque no Brasil, não há açúcar amarelo e nem gelo picado.
Do pão de queijo à churrascaria rodízio, encontra-se de tudo. Até a tapioca, uma iguaria que eu julgava restrita ao Nordeste brasileiro, já figura em centros comerciais chiques do país. Além do repertório gastronômico, décadas de telenovelas e de movimentos migratórios deram aos portugueses uma compreensão imbatível dos hábitos, dos costumes e até das gírias brasileiras menos óbvias. A nossa música – da amada MPB ao controverso sertanejo – também se faz sempre presente por esses lados. Passear no Bairro Alto ou ir a uma discoteca quase invariavelmente rende algum encontro sonoro com artistas tupiniquins.
Até o Rock in Rio, símbolo máximo de uma geração, cruzou o oceano e veio parar por aqui. E não parece haver um ano em que Ivete Sangalo deixe de visitar este cantinho tão adorável da Península Ibérica.
Sem contar, é claro, a cereja no topo do bolo: os excelentes índices portugueses de segurança pública, saúde e educação, itens que andam cambaleantes do outro lado do Atlântico.
O fato de Portugal ser uma espécie de ilha sem atentados terroristas em uma Europa que sofre cada dia mais com ataques de todos os tipos, também faz brilhar os olhos dos brasileiros que vivem aqui. Aliás, acho que neste quesito, estrangeiros e portugueses de todos os cantos sorriem e respiram aliviados.
No entanto, brasileiros e portugueses ainda parecem separados por um abismo de preconceitos, que se manifestam nas pequenas atividades quotidianas.
E isso independentemente de estarem em situação legal ou não em Portugal. Ter a cidadania portuguesa não é sinónimo de tratamento semelhante e nem garantia de não sofrer com os problemas que os brasileiros enfrentam.
Todos sabem que arranjar uma casa em Lisboa anda difícil. Até a Madonna já foi às redes sociais reclamar publicamente do assunto. Se está difícil para ela, imagine para nós.
Arrendar uma casa tendo um sotaque brasileiro parece trazer todo um outro universo de dificuldades. A coisa toda é tão trabalhosa que deveria ser incluída como modalidade olímpica.
Os problemas costumam começar já quando o senhorio ou agente imobiliário reconhece o nosso inconfundível sotaque. Não raro, instantaneamente o imóvel “afinal já não está disponível”.
Também há o milagre da multiplicação das cauções. Este, particularmente, já aconteceu algumas vezes comigo e com meus conhecidos. Diante da fama de festeiros dos brasileiros, costumam pedir um – ou até três ou quatro! – meses adicionais no momento de assinatura do contrato.
Para as mulheres brasileiras em Portugal, a coisa fica um pouco mais complicada. Uma vez ou outra – embora seja menos frequente do que já foi antes – temos de lidar com um enraizado estigma de sexualização. “Mulher brasileira é mais fácil” ou “as brasileiras vêm aqui caçar marido” são dois clássicos, que muitas vezes nos perseguem, mesmo entre os portugueses mais abastados e escolarizados. Já os vi a serem reproduzidos por colegas do meu doutoramento e até por familiares do meu namorado a lista é grande.
Felizmente, a coisa tem mudado. Para melhor!
Portugueses e brasileiros mostram-se cada vez mais abertos a abraçar e compreender as diferenças, derrubando a barreira dos estereótipos que muitas vezes atingiam a ambos.
Por: Giuliana Miranda
Jornal Diário de Notícia
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